terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Hospitais

Lembro-me muito bem do dia em que saí de uma cirurgia normal (como se abrir uma pessoa e costurá-la depois pudesse ser algo muito normal), e, ainda grogue pela anestesia, fui colocado sobre uma daquelas frias camas de hospital. Um local de uma brancura alvejante e que me alvejava, me oprimia.

Era um pequeno quarto duplo, parecia ter sido um depósito há bem pouco tempo. Tinha duas camas, bem próximas uma à outra. Como eu só passaria a tarde ali, apenas precisava tomar um soro e comer uma gelatina sem gosto, fiquei na cama mais próxima da porta de entrada e saída. Interessante como uma única coisa pode ter duas funções tão opostas entre si, nos utilizamos do mesmo artefato tanto para entrar quanto para sair.

A enfermeira aparecia vez ou outra, era um hospital tranquilo, nada dos absurdismos das emergências, ninguém vertendo sangue por ter tomado um tiro no pâncreas. Na cama de meu companheiro de quarto, um sujeito acabado parecia moribundear. Estava aparentemente muito fraco, contorcido por supostas dores, enquanto a minha anestesia passava aos poucos, e eu voltava a sentir meu nariz enfaixado e coberto por ataduras.

As primeiras horas passaram sem grandes novidades, nem anjos e nem a safada da dona morte buscando ninguém. Eu começava a ficar ansioso pela aproximação do horário da minha alta, quando o sujeito acorda lentamente de seu sono arrebatador. Ele se senta na cama, com algumas dificuldades, mas sem titubear. Puxa assunto enquanto eu degluto a gelatina insossa.

Voltei para casa naquela noite preocupado com o tanto de pus que vazava do meu curativo. Nada de mais, apenas um fluído corporal indesejado. O sujeito ficara, tinha ainda uma longa recuperação. Sua cirurgia fora muito mais invasiva, ele estava lá pois havia doado parte de seu fígado a alguma pessoa da família, ou coisa parecida.

O branco, a gelatina, o soro. Tenham aberto o teu nariz, ou o teu abdômen, a situação não difere muito. Entramos e saímos pela mesma porta, e ainda há de algum dia voltar, no absurdismo da emergência ou na calmaria do leito. Bom, eu estava em casa, e o sujeito tinha um naco de fígado a menos.

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