terça-feira, 18 de junho de 2013

Sobre Voar e a Destruição de Nossos Tempos

Dizer que "voar é vencer o ar" é um paradigma muito contraditório, visto que só se voa porque o ar existe. Caracteriza-se então, uma relação de parasitismo, em que se tira ligeiro proveito do ar, de forma prejudicial, pois que com a fabricação de aeronaves, e a queima dos afamados combustíveis fósseis por parte dessas, polui-se-o, esse que é essencial para o exercício de sua mesma existência.

Não tem o que esquecer, quando não há nada para lembrar. A memória é exatamente o principal problema, e é ela que serve pra nos ajudar a não levar mais pedrada. Conquanto por vezes ela falhe, engane, deturpe a existência do real ou do surreal. Ou ainda aquele real imposto.

Eu diria que medo de sentir medo é medo também, mas dizer isso pra quem? Eu diria que se esconder da visão é cegueira também, mas dizer isso pra quem? Estou falando com as minhas vozes. Todas essas colegas de tempos imemoriais, e que, quem sabe?, teria a memória as inventado, como dizendo que "olha, você existiu antes". Mas não, não existiu antes, quiçá nem agora, menos ainda depois.

Voar é abstração, é metáfora também, explicação deveras desnecessária àqueles que têm visão poética. Mas oras, algumas pessoas possuem almas apaixonantes. Filmes reprisados, histórias recontadas. Assuntos demais.

Tudo bem destruir o ar de vez em quando. Tudo bem rasgar o chão e definhar de vez em quando. Mas oras, cuidado com ideologias distorcidas! Cuidado com o estouro da manada! Cuidado com a falta de inimigos, ou mesmo de armas! Não há o que vencer, se não há a quem enfrentar. Como não há o que voar, quando há falta de ar. Como não há o que amar, quando, oras, quando não há.

Voar é uma ideologia também, quando não é natureza. Jimmy diria que "mama, I've gotta try". Não sabe você que todos os heróis já morreram? Em tempos tão opiniáticos, deve-se lembrar que é sempre mais fácil falar do que realizar. Também é fácil falar que é mais fácil falar do que realizar. Difícil é voar. Difícil é aprender a voar sem destruir o ar.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Por não Sabermos por Onde Começar, Terminamos

(ou Crônicas de uma Madrugada Descabida)

Nós somos aqueles que bebemos a própria noite em tragos largos. Ela, por vezes, não cabe nela mesma, e se torna proibida, irresponsável, indesejada. E o amanhecer é a maior das mortes.

Houveram tempos em que não se sabia para onde ia. Acho que na verdade, nunca sabemos, continuamos seguindo essa história de "go with the flow", mesmo querendo ser os mestres do nosso próprio destino. Não há muito o que se fazer quando as coisas preferem se fazer sozinhas. Elas simplesmente acontecem, bem ou mal, e a nossa parte nessas histórias simplesmente é acontecer.

Já vivi com o sol alto, já morri com a lua escura. Andamos a esmo, sem rumo ou razão. À noite, ninguém tem razão, estão todos errados, a própria noite está errada. Ela acha que sabe de tantas coisas, não sabe nem mesmo quantas almas agrega, onde começa ou onde termina. Seria a noite aquela cobra deglutindo o próprio rabo?

Ninguém escolhe as próprias horas, podemos no máximo prever, tencionar, querer, mas o que as horas trarão só elas mesmo decidem. E elas te levam, aos caminhos mais insanos e errados. As horas que fazem parte da madrugada te fazem entrar em bares, em bodegas, em purgueiros, nos mais profundos poços da insuficiência humana. Elas te fazem vomitar em banheiros sujos e mal frequentados.

E dançamos. Sim, como dançamos! Nunca paramos de dançar, com a vida principalmente, essa hábil bailarina. E com todas as outras coisas também. Por vezes, somos tirados a bailar; por vezes, precisamos ser aqueles que tiram, numa constante inversão de papéis. Dançamos até mesmo parados, pois dançar é uma excelente metáfora quando se trata de tudo aquilo que não temos.

E pela manhã, bebemos a vida em largos tragos, comemos a vida em fundos pratos, mestres de nossas próprias horas. Pois que pelo menos de vez em quando, as horas se esquecem de mandar, e todos os saguões ainda serão nossos.

Ainda há muito o que resolver, pois que para tudo o que não está morto a vida exige soluções. Decisões. Reimpressões do regular. Tentar reencontrar algo que se perdeu em meio aos passantes, aos bailantes, aos abraços tortos. Certezas incertas. E seguir com a corrente, pretensos mestres de nossos próprios destinos.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Sísifo Acorrentado

Um corpo em depressão tende a permanecer em depressão até que Sísifo venha lhe tirar da inércia morro acima, para então, logo depois, cair novamente, numa espécie de montanha-russa estática e eterna. Sísifo, porém, está também a cumprir com sua própria inércia, resultado de sua própria rebeldia. Rebeldias somadas geram inércias e depressões. Assim se criam físicas e geografias.

Escrevo poesias em guardanapos de bordel. Buscando desesperadamente por adicção, invento palavras como quem inventa sentimentos. Invento escreveres como quem inventa contextos e contextualizações. Tudo não são mais do que letras no papel, na tela, ou na cabeça, signos do pensamento abstrato, representações do irrepresentável, abstração do subjetivo.

O amor da minha morte, uma droga que chamem morte, adictiva e intransigente. Em tempos desperdiçados, determinados pela angústia do não-viver, viver é a maior das drogas, morrer é a maior das adicções. Pois que, como já disse, as coisas com muito mais frequência são não do que são sim.

O que devemos e podemos já não importa, toda as lutas estão perdidas, as batalhas são derrocadas e hecatombes desnecessárias. Desesperadamente determinados. Necessário mesmo é fazer vencer a inércia. Oras, essa contradição fisicista! Não se vence, aprende-se a viver com ela, tratam-se acordos, e quem sabe se Sísifo não tenha ele mesmo escolhido seu castigo num acordo tétrico.