domingo, 29 de maio de 2016

Vendendo Minha Alma pela Minha Carreira Política - Capítulo 1 - Como Tudo Começa

Poucas coisas por essas terras parecem render maior status social e proveitos econômicos do que um cargo eletivo em órgão da administração pública. Talvez apenas o cargo de ex-BBB ou de apresentador(a) de programa de auditório, jogador de futebol talvez.

Mas a grande briga mesmo, o maior vestibular de nossos tempos, se concentra em tentar cooptar uma vaga no executivo ou no legislativo. Para isso, como em qualquer método seletivo, as pessoas fazem uso das armas que possuem. Alguns estudam, alguns colam.

No entanto, existe uma diferença crucial neste método seletivo: você é selecionado não pelas suas habilidades lógico-cognitivas, mas sim pela sua capacidade de convencimento. É como se no vestibular para a universidade você precisasse convencer o fiscal de prova que merece a vaga mais do que os concorrentes.

Eis que para se tornar vereador ou prefeito, deputado ou governador, senador da nação ou presidente (isso sem entrar ainda nos âmbitos eletivos das administrações menos amplas, os trampolins), a pessoa está disposta a abdicar da moral e da ética para conseguir o que almeja.

É assim que a carreira política é, em termos gerais, um imenso mercado de almas. As que não nasceram corrompidas, corrompem-se assim que decidem fazer parte da brincadeira. Claro, há várias delas que conseguem passar incólumes pelas eleições e pelos cargos que por ventura venham a ocupar, porém sequer se tratam da maioria.

Acontece que esse padrão comportamental é o oposto do que deveria ser. Líderes deveriam ser íntegros, figuras a serem admiradas. Então o cidadão comum, aquele que nunca pensou em se candidatar, se revolta e decide fazer parte do vestibular, porque ele sim é íntegro e pode vir a ser alguém a ser admirado. Ele tem a resposta!

E então ele vende também a sua alma pela carreira política.

Continua...

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Auto-Consciência do Tempo

Toda criatura constituída em três dimensões possui uma auto-consciência espacial. Mesmo os seres unicelulares mais simples são capazes de compreender o seu próprio tamanho e saber da sua localização. Todo ser vivo sabe que existe por se colocar em um espaço. Um animal sabe onde termina o seu próprio corpo e começa o próximo. No toque, no equilíbrio, no tato. A pele que roça, o chão e o céu em seus respectivos lugares. A dor ao entrar em contato com algo pontiagudo, quente ou frio demais, lacerante.

Todo ser vivo que existe e já existiu nesse planeta, e se locomove de algum jeito, sabe onde está e para onde precisa ir. Distância, tamanho, largura, profundidade. Conceitos relativos para cada criatura, perspectivas diferentes, mas conhecimentos essenciais para o funcionamento da vida. A auto-consciência espacial faz parte de todos os seres vivos.

Contudo, há uma outra auto-consciência, relativa à quarta dimensão, que apenas os seres humanos visualizam em sua abordagem com relação ao mundo. Trata-se da auto-consciência temporal. Não falamos de espaço-tempo, que é um outro conceito, utilizado em perspectivas maiores. Falamos do tempo como unidade básica, com suas próprias dimensões: antes, agora e depois.

Naturalmente, podemos aplicar vários dos mesmos conceitos do espaço para o tempo, como distância, tamanho, e quando começa e termina um determinado momento. O tempo é também uma dimensão. Porém, o problema dessa auto-consciência, e a diferença entre as duas, é que é ela que gera uma espécie tão transtornada e complexada.

A culpa de não aproveitarmos o agora como deveríamos vem da nossa auto-consciência. A própria existência de conceitos como antes e depois nos prende invariavelmente a eles, prejudicando a nossa experiência com o agora. Há o lado bom, planejamos e executamos, a sociedade evolui e contabilizamos essa evolução. O lado ruim, no entanto, é muito mais evidente. Sofremos por um passado que para os outros animais não existe; e deixamos as coisas para um depois que nunca chegará.

Com isso, não aproveitamos o momento. Vivemos vidas vazias de agora, mas cheias de antes e depois. Fotografamos um acontecimento para que depois lembremos do passado. Há que se viver mais no âmbito do agora. É preciso deixar de lado essa auto-consciência temporal que permeia nossa espécie, pelo menos de vez em quando. Precisamos passar mais parte do nosso tempo vivendo de verdade esse tempo que estamos vivendo. Não o antes ou o depois, mas sim o agora. Porque é o agora que importa.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Não-Pertencimento

O sentimento de não-pertencimento é muito mais forte e destruidor do que qualquer sensação de pertencimento.

Pertencimento não está ligado somente ao espaço físico onde se vive, onde se trabalha ou no local de lazer frequentado no domingo a tarde. A sensação de pertencimento está muito mais conectada a uma relação mútua entre o ser e o ambiente, expressa não só pelo espaço físico, como também pela aceitação em determinado grupo ou padrão, ou por se sentir como um igual aos que o cercam.

De qualquer forma, é fácil pertencer. Basta qualquer sensação em comum, qualquer necessidade do ser satisfeita pelo meio. Mesmo um pequeno detalhe pode ser suficiente para uma pessoa se sentir completamente pertencente a um local ou a um grupo.

O problema está no não-pertencimento. Em não se encaixar em absolutamente nada. Sente-se uma constante e inexplicável ansiedade, vinda de lugar nenhum e que leva a lugar nenhum também. O não-pertencer gera uma sensação muito mais acachapante do que qualquer orgulho por pertencer. Dói não-pertencer.