Me apaixonei pelos céus plúmbeos há muito tempo, nem me lembro quanto. Mensurar o tempo é como mensurar a chuva, só podemos estabelecer um parâmetro de comparação em vista de uma pequeníssima coleta que fazemos. A chuva é muito mais do que apenas milímetros cúbicos. Isso seria como dizer que o tempo é apenas alguns segundos. Por isso, me apaixonei pelos céus plúmbeos há imensuráveis milímetros cúbicos.
Não posso confiar em quem nunca dançou na chuva, em quem nunca parou tudo o que estava fazendo para observar a queda das gotas no chão já encharcado, em quem nunca admirou o alegre farfalhar das árvores ao receber a água em suas cabeças, em quem compra um guarda-chuva a cada chuva. A chuva é uma das coisas mais vivas que existe.
Me admiram os vendedores de guarda-chuvas, saídos de lugar nenhum, na noite fria de sexta-feira na entrada do shopping. Anunciam seus produtos como quem anuncia a salvação para as mazelas do mundo, a panaceia que curará peste, guerra, fome e morte, deixando até mesmo os quatro cavaleiros sem emprego.
Não conseguem perceber como estão errados com suas frágeis armações de aramado e plástico, vendendo o mesmo produto para pessoas que confirmam, sem constrangimento, já terem dois ou três semelhantes aquele em casa. Como estão errados em oferecer uma proteção subjetiva, totalmente imaginária, para pessoas que têm medo de andar alguns passos sob as águas.
Torço para os raios e os trovões. Comemoro a chegada das nuvens escuras. Desejo o aguaceiro, a tempestade. Felicito a enxurrada, a garoa, o vidro da janela molhado. Não há nada de errado em se molhar. Pelo contrário: o erro está em fugir da chuva. O erro está em não gostar da chuva, em não gostar de caminhar tranquilamente sob ela.