terça-feira, 1 de março de 2016

Sobre Olhar Para o Vazio

Acho incrível como uma pessoa pode ser a pessoa mais importante da sua vida durante um determinado período de tempo e, de repente, sem mais nem menos, um tempo depois você não sabe mais absolutamente nada sobre ela.

Todas as pessoas que conhecemos funcionam como ondas sonoras em nossa alma. Algumas são lindas músicas, outras são o barulho da maquininha do dentista. Mas todas elas marcam a nossa existência de alguma forma, e, dependendo do volume e da intensidade de sua presença, podem ficar ecoando dentro de nós por muito tempo. Reverberando nas paredes, o som dessas pessoas vai e volta, se torna apenas um leve ruído de fundo e então volta em um barulho ensurdecedor.

Somos como imensos galpões vazios, ocupados apenas pela poeira e pelo som, onde todas as pessoas são ecos em nossa alma. Cada um desses sons chega um dia ao seu final. Vai aos poucos morrendo, se apagando em um fade out imperceptível até que não nos damos mais pela ausência daquele som. Ou então desaparece de uma vez, como um aparelho subitamente desligado da tomada.

De repente o eco volta um dia, sem mais nem menos, com força total, como um grito rasgando todas as gargantas. E você para para ouvir aquilo, e percebe que é um som antigo, um barulho atrasado, mesmo que seja ainda daquela linda música. E você quer apenas sentir o som e apreciar aquelas ondas de uma frequência que acalentam a tua alma. Mas é uma música antiga, que já foi ouvida, e a música nova não existe mais.

Quando paro a olhar para o vazio, estou apreciando esses ecos da antiguidade. Observo com olhos o que apenas o ouvido pode ver. Procuro calma dentro do meu galpão. Tento ver o que só se pode ouvir. Olhar para o vazio é um ato de prescrutar não só as ondas de luz, como também todas as outras vibrações: as vibrações do ar que fazem o som. Quero ver esses ecos, saber onde eles estão, quando vão e quando voltarão. Quero ter aquelas lindas sinfonias presentes, mesmo que em um eco arcaico da memória.