segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Há Um Ano - parte 2


Às criaturas da água pertence apenas o abismo de baixo, o mais pesado de todos. O abismo dos céus lhes foi negado. Mas tudo bem, não nos importamos. Em nossa sensitividade abstrata vivenciamos todos esses mundos dos quais nem mesmo fazemos parte.

E quem quer que seja a entidade, física ou metafísica, que desenhou e gerou o universo, deve ter decidido não dar asas aos seres líquidos por saber que assim lhes seria fácil demais dominar absolutamente tudo. É natural que estejamos presos aos mares e às marés.

Somos líquidos. Mas não na ideia baumaniana da modernidade líquida. Na ideia de que somos adaptáveis, nos adequamos ao recipiente. Vivemos uma vida líquida. Não no sentido fluido superficial. Mas no sentido de dois hidrogênios e um oxigênio se replicando continuamente, rumo ao infinito de nossos recipientes imensuráveis.

Somos duas gotinhas de chuva despencando do abismo de cima, se entrelaçando durante a queda. Somos o elixir da vida, a nossa mútua panaceia particular. Poderíamos morar em nosso abraço de universo inteiro, nascido em novo big bang a cada vez que nos encontramos. Cada um de nossos abraços é uma explosão de sensações e experiências e mundos surgindo.

Minha deslumbrante criaturinha do abismo do mar. De todas as explosões de sensações que nos permitimos, você é a maior. De nossos dois hidrogênios e um oxigênio, que somos nós. Em nós cabe, e transborda, um universo inteiro de emoções. Cabe minha pequena cura diária para os males deste mundo louco.

Vivemos já um ano dessa imensa intensidade com teor de tempestade, alagamento, tsunami, enchente e inundação. E que toda a água de nosso mundo nunca se evapore.

Um comentário: