Ainda quero conversar com quem fez a vida assim tão triste. Não que isso seja ruim, definitivamente não é. Mas eu gostaria de saber o que pensa, onde vive, como gosta da gema do ovo. Acontece que a tristeza anda à nossa volta, em tudo o que não temos ou perdemos. Apesar de não ser só isso, definitivamente não é. É muito mais, é um modo de viver, é andar sozinho pelas ruas, é olhar o céu procurando estrelas, é sentir-se mal mesmo quando tudo vai bem. É viver na medida do impossível.
Everybody is sad in the city of dreams. Aquelas almas andavam à esmo, sem rumo qualquer, almas perdidas há várias gerações, sendo as mesmas almas que um dia foram seus pais. Paravam em cada esquina, observando os passantes. É noite, as criaturas notívagas saem de suas tocas, tudo por aqui é pretexto, é tudo uma tentativa falha de motivação. Há tanta companhia e tanta ausência ao mesmo tempo. Tudo, absolutamente tudo, parece o que não é.
Quem sabe um dia, depois de tanto tentar nos enganar, consigamos provar a nós mesmos que não somos assim tão tristes. Por isso andamos tanto por essas ruas, procurando esbarrar em um passante qualquer. Por isso nos utilizamos de todas as substâncias alteradoras de consciência possíveis. Por isso respiramos a noite, e deglutimos o tempo através de um esôfago ofídico. Mas não é assim tão simples, tentamos a todo momento nos convencer de verdades que nunca foram verdades, e nunca serão. Continuaremos com nossas tristezas.
Na verdade mesmo, a tristeza está em todos os lugares. Anda impregnando o próprio ar. Quase consigo tocá-la com as mãos, acariciá-la, pedir pra que ela me deixe um pouco sozinho. Cada átomo de oxigênio navegando as minhas veias carrega consigo uma partícula de tristeza. A coisa mais estranha desse mundo é saber exatamente qual vai ser a causa da sua morte. Idi Amin sabia, mas não contou pra ninguém.
E o ar me foge, fica difícil respirar. Até as tristezas fogem, são aquela música que fica tocando como som ambiente, bem baixinho lá no fundo, até o ponto em que praticamente só se ouve uns estalos do grave. Com a tristeza impregnando o próprio ar, é isso que respiramos quando conseguimos respirar. Tudo à nossa volta devaneia, nas ruas as almas ainda vagam em busca de seu lugar. Prefiro meu ovo com a gema mole. O fato é que não se morre de tristeza, se morre da falta de ar. De tristeza só se vive.